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Excerto da sua obra “secret history of the american empire“
Bolívia, tal como o Equador e Venezuela, começou o século XXI com protestos contra as empresas estrangeiras que saqueavam os seus recursos. Demonstrações, boicotes, greves que interromperam actividades comerciais ao longo das ruas de La Paz e em muitas outras cidades. Esta luta, encabeçada por dirigentes dos « Aymara» e «Quechua», os povos indígenas não estavam sozinhos; sindicatos e organizações civis apoiavam as suas lutas.
Ao contrário do Equador e Venezuela, a causa imediata da agitação não era o petróleo. Era a água. Durante os anos 90, tornou-se cada vez mais evidente que água seria em breve um dos recursos mais valiosos do planeta. A “Corporocracia” entendia que ao controlar os recursos de abastecimento de água, poderia manipular as economias e seus governos.
Mais uma vez, a agitação na Bolívia foi detonada pelo Banco Mundial e FMI. Em 1999, as duas organizações insistiram que o Governo boliviano vendesse o sistema público de água da sua terceira e maior cidade, Cochabamba, a uma subsidiária da gigante de engenharia, «Bechtel». Perante a insistência do Banco Mundial, a Bolívia concordou também em passar os custos associados ao fornecimento de água para todos os consumidores, – independentemente da sua capacidade para pagar — atitude contrária às tradições indígenas, que professam que todos têm o direito inerente à água, seja qual for o estatuto económico.
Quando soube que a Bolívia tinha caído no estratagema de um EHM (Economic Hit Man /Assassino Económico), fiquei cheio de remorsos e senti-me culpado. A política (PPE – Every-Person-Pay), foi uma abordagem à taxa da estruturação de tarifas, que ajudei a formular em meados da década de 1970. Nessa altura, a ideia era só aplicada a tarifas eléctricas e foi considerada inovadora.
A PPE contradiz a premissa básica da maioria dos planos de taxação, defendida para ajudar as regiões pobres desde a década de 1930, incluindo as adoptadas pela Administração da Electrificação Rural (REA) nos Estados Unidos: esses serviços de fornecimento de electricidade, água e saneamento, são essenciais para o crescimento económico em geral, mesmo que tivessem de ser subsidiadas. Seguindo o exemplo de REA, a aplicação desta teoria tinha provado ser altamente eficaz em numerosos países. Apesar dos sucessos, o Banco Mundial decidiu experimentar algo de mais radical e diferente.
A abordagem do PPE iria transformar burocracias governamentais subsidiadas pelo governo em rentáveis resultados prontos para privatização (como eu iria descobrir mais tarde na Bolívia em COBEE). Numa viagem à Argentina, o General Charles Noble disse-me: “Esses países são a nossa futura segurança”.
Disse-me Chuck com um grande sorriso: “Perdemos o Vietname porque não entendemos a mente comunista. Temos que fazer muito melhor aqui na América Latina. Não deixem os socialistas falar com você, pensando que se oferecerem um almoço, compram qualquer coisa. As pessoas têm de pagar pelo que obtêm. Só assim que é que apreciam. Além disso, ensina-se capitalismo, não comunismo. Olha para ali. Apontou para um parque perto de uma lagoa: “Combinação da água, futuro ouro e petróleo. Precisamos de possuir o mais possível estes dois “ouros”. Só assim é que teremos o grande poder.”
Quase imediatamente após a concessão da SEMAPA à Bechtel, as taxas da água dispararam. Alguns Coochabambans viveram um aumento das suas contas em 300%. Isto foi catastrófico para os habitantes da cidade, que já pertenciam ao grupo das pessoas mais pobres do continente. Eles depararam-se com a escolha entre a comida e água,” disse-me um organizador de Quíchua.” Os gringos querem mais lucros. Os Bolivianos estão a morrer de sede. Eles dizem-lhes que nem podem recolher a água das chuvas, pois o contrato com a SEMAPA, exige que devam pagar a Bechtel toda e qualquer água que consumam“.
Os cidadãos de Cochabamba revoltaram-se. O Presidente Banzer instituiu a lei marcial. Em seguida, depois de uma reunião com oficias da embaixada dos EUA, anunciou que ia anular o contracto com a Bechtel. Em Abril de 2000 a Bechtel abandonou suas operações em SEMAPA.
O povo de Cochabamba comemorou a vitória. Partilharam xícaras de água nas ruas. O objectivo mais importante da companhia de água seria o abastecimento de água aos pobres, inclusive para aqueles que anteriormente não tinham sido conectados ao sistema. Fornecer uma compensação adequada aos seus trabalhadores e operar com eficiência e sem corrupção.
Enquanto isso, o Governo da Bolívia, ainda teve de lidar com a “Corporocracia”. Bechtel não estava predisposta a desistir da sua galinha de ovos de ouro. Num caso clássico que demonstra a capacidade da dela na manipulação do direito internacional para atingir os seus objectivos, Bechtel usa uma das suas companhias holandesas. Desenha em 1992 um tratado bilateral de investimento, (BIT), entre a Holanda e a Bolívia, (uma vez que não existia nenhum entre os Estados Unidos e Bolívia), e a filial holandesa entra com uma acção de US $50 milhões contra o povo da Bolívia. Metade do valor referente a lucros alegadamente perdidos do seu “expropriado investimento” e a outra metade por danos.
Esta incrível história da intriga corporativa, ganância e insensibilidade foi em grande parte ignorada pelos media dos Estados Unidos. No entanto, a imprensa latina cobriu-a extensivamente.
Da turbulência, surgiu um novo líder. Evo Morales era um activista Aymara e juntou-se ao Movimento Socialismo (MAS). Era uma voz forte contra a privatização e reformas económicas de mercados livres, politicas que impediriam a Bolívia de proteger os seus agricultores e empresas e, ao mesmo tempo forçando-a a aceitar as barreiras proteccionistas dos Estados Unidos.
Sua popularidade cresceu e foi eleito para o Congresso. Quase imediatamente, a “Corporocracia” rotulou-o de terrorista. O departamento de Estado dos EUA descreveu-o como um “agitador ilegal de coca. Morales que participou no movimento cocalero – uma coligação de camponeses do cultivo de folha de coca que resistiu aos esforços americanos de erradicaram as fazendas de coca – observou que a planta era utilizada pelos povos andinos como um suplemento dietético e medicinal muito tempo antes de se converter em cocaína. A coca, era remédio para dores musculares, dores de fome e outros distúrbios digestivos. Chá de coca tinha sido bebido por muitas personalidades, incluindo João Paulo II e a princesa Anne da Grã-Bretanha. No entanto, Morales foi forçado a sair da sua cadeira no Congresso em 2002 sob a acusação de terrorismo. Que-chua e Aymara acusaram a CIA de planear o seu afastamento. Nos meses seguintes, a sua expulsão foi declarada inconstitucional.
O embaixador dos EUA, Manuel Rocha advertiu, “quero lembrar os eleitores bolivianos, que se elegerem alguém que queira tornar de novo a Bolívia num exportador de cocaína, irão colocar em perigo a futura assistência americana à Bolívia.” Em vez de dissuadir os Bolivianos, Rocha inflamou-os. Morales declarou que as palavras do embaixador tinham ajudado a “despertar a consciência das pessoas”. MAS colou cartazes nas paredes em todo o país. Uma enorme foto de Morales, e em letras enormes perguntava-se: “Bolivianos: Você Decide: Quem manda? Rocha ou a voz do povo”?
Presidente Sanchez cede às exigências do FMI e Banco Mundial. Em 2002 decreta um enorme aumento de impostos. Como tantas vezes acontece nestas circunstâncias, aqueles que menos podiam pagam impostos foram os mais atingidos. Bloqueios de estradas e manifestações levaram o país a uma paragem. Os planos de Sanchez para exportar gás natural a preços baixos para os Estados Unidos e outros países em vez de o distribuir pelos bolivianos carentes ainda inflamaram mais as comunidades indígenas.
Sanchez foi forçado a fugir do país. Os Estados Unidos recusaram os pedidos da Bolívia para que ele retornasse para ser julgado. Os Bolivianos tinham desafiado o Banco Mundial e tinham-no derrotado.
De certa forma, parece-me que a verdadeira mensagem que se pode extrair deste doloroso processo, não se destina só a bolivianos e latinos. Também se destinou a Bechtel e ao resto da “Corporocracia”. Foi uma mensagem pró-democracia, pro-justiça que serviu para inspirar as gerações mais jovens na Bolívia, dos Estados Unidos e do mundo.”
Depois de traduzir estes excertos da obra de John Perkins, tenho que reconhecer a nosso total desconhecimento das provações que algumas nações têm vivido por parte de entidades, que na nossa actualidade estão a ser tantas vezes referidas (FMI e Banco Mundial). Esta elite que têm os seus braços dentro destas organizações, tudo faz em prol de um sonho de poder e de domínio, sendo o meio usado sempre o mesmo: usurpação dos recursos naturais que “invejam” de outras nações. Não interessa o mal que infligem, desde que o lucro da exploração (tantas vezes conseguidas através de subornos) vá parar aos seus bolsos.
Espanta-me que os USA se intitule de “defensor” da tirania, do terrorismo, e não exista no resto do mundo, nenhuma organização, Estados, que defendam estas nações da tirania / opressão / usurpação / de quem se auto proclama de salvador.
Lendo o que tem sido exposto pelo Wikileaks, verifico com tristeza, como tantos governos se deixam manipular. A própria Comunidade Europeia cede ao engodo da luta contra o terrorismo e autoriza, (depois de descobrir que os USA, sem a sua autorização, acederam à base de dados financeiros europeia Switt, e depois de 3 votações) o acesso à mesma. (Switt contem dados de transacções financeiras de bancos, empresas e particulares da UE)
Portugal não fica de fora deste padrão. O que esteve em jogo, quem foi comprado, para ter dado o acesso aos nossos dados do BI aos Estados Unidos, passando por cima da Assembleia de República e Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD)?
Afinal quem são os terroristas?
Confissões de John Perkins – Chaves da Venezuela
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Confissões de John Perkins – Bolívia: Bechtel e as guerras de água
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