«Como membros da comunidade de juristas europeus, vimos exigir a não inclusão dos mecanismos ISDS tanto no TTIP como no CETA, pelas seguintes razões:

– A protecção de investimento (ISDS) estabelece privilégios para os investidores estrangeiros baseados em padrões vagos. Este mecanismo concede-lhes privilégios substantivos e processuais relativamente a todos os outros actores sociais.

Os substantivos padrões de protecção tais como o “tratamento justo e equitativo” e a “protecção contra a expropriação indirecta sem compensação” têm sido interpretados em sentido muito lato, em parte devido à formulação vaga constante nos tratados. Alguns padrões são altamente controversos, dado poderem cobrir situações em que a legítima regulação do bem público resulta no pagamento de compensações aos investidores estrangeiros. As disposições do ISDS permitem aos investidores apelar à arbitrariação, painel composto por 3 árbitros, no sentido de invocar direitos substantivos e interpretar qualquer decisão política, administrativa, ou judicial que possa afectar os seus negócios. Assim, os investidores podem responsabilizar o estado pela perda de lucros expectáveis, mesmo se as medidas do governo foram não-discriminatórias, legais numa perspectiva doméstica e desenhadas, por exemplo, para proteger o ambiente, a saúde pública ou os direitos dos trabalhadores, renacionalizar caminhos de ferro, água, energia ou sistemas de saúde.

Aos investidores estrangeiros são concedidos estes privilégios sem que se encontrem sujeitos a nenhuma acção de responsabilização que possa ser invocada pelo estado ou por quem seja afectado pelo investimento.

– A protecção do investimento e o ISDS ameaçam a regulamentação no campo do interesse público, nas alterações democráticas e nos orçamentos gerais do estado.

A protecção do investimento constitui uma alteração de poder em benefício individual e de influentes actores comerciais, na medida em que enfraquece a defesa dos interesses públicos e restringe a possibilidade de alterações democráticas. À luz das grandes quantidades de fluxos de investimento transatlântico, a introdução da protecção do investimento estrangeiro no TTIP e CETA vai potenciar a realização de um enorme número de queixas e a altas indemnizações de muitos biliões a pagar pelos cofres públicos. Isto tem também como consequência o “congelamento regulatório”, uma vez que os governos se irão abster de aprovar medidas regulatórias de interesse público, devido à ameaça da arbitrariação e das elevadas indemnizações que acarreta.

Ao abrigo dos tratados existentes, os investidores têm utilizado este mecanismo para interferir efectivamente nas alterações políticas democráticas. Este problema não pode ser subestimado, uma vez que tanto países ricos como pobres têm sido alvo desta pressão.

– O ISDS é um sistema de favorecimento e não contém a salvaguarda do estado de direito. O actual sistema do ISDS não contém salvaguardas que assegurem a independência e a imparcialidade, dois pilares cruciais do estado de direito: os árbitros são pagos caso a caso e as queixas apenas podem ser apresentadas pelos investidores estrangeiros. Isto cria um incentivo sistémico à interpretação da lei a favor do investidor. Esta parcialidade sistémica é particularmente preocupante visto os árbitros disporem de uma discrição muito mais lata que os juízes domésticos a todos os níveis do processo: desde a admissão das queixas e outros aspectos processuais, até à aplicação de padrões substantivos vagamente formulados e à avaliação da compensação adequada.

– A última proposta da CE não oferece remédio para estes males.

A proposta da CE para o capítulo do investimento no TTIP e CETA faz muito pouco para resolver estas questões essenciais sobre a lei internacional dos investimentos. Continua a proporcionar aos investidores os mesmos privilégios substantivos e a dar uma larga possibilidade para determinar as medidas governamentais nesse contexto. Por um lado, falha em resolver o problema dos padrões vagos de um modo efectivo. Mesmo apesar de procurar melhorar os actuais problemas de largueza interpretativa, deixa em aberto alçapões alarmantes. Mas mais importante ainda, falha em limitar a protecção substantiva à não-discriminação apenas.  Continua a incluir padrões como o FET (Free Economic Trade) e a protecção contra a expropriação indirecta que concedem privilégios substantivos aos investidores estrangeiros. Oferecendo apenas a protecção não-discriminatória aos investidores estrangeiros, teria sido a melhor opção para ajustar a protecção do investimento estrangeiro ao nível da protecção doméstica.  Ao mesmo tempo, teria sido um caminho viável para proteger a flexibilidade regulatória dos estados, ponto essencial de uma sociedade democrática.

Em contraste, as medidas para proteger o direito dos estados a regular no interesse público estão condenadas ao fracasso. As disposições relevantes são meramente interpretativas e incluem diversas qualificações e restrições ao espaço das políticas públicas.

Por outro lado, a proposta do Investment Court System introduz alguns melhoramentos institucionais no ISDS, incluindo um mecanismo de apelo e exigência de transparência. Os investidores deixam de ter qualquer papel na nomeação e escolha dos árbitros. Em vez disso, o ICS terá um painel de 15 juízes que operam rotativamente em grupos de 3. Contudo, o ICS continua a não dispor de importantes salvaguardas de acordo com o estado de direito. A imparcialidade e independência dos juízes não está totalmente assegurada. Não quer isto dizer que os juízes sejam necessariamente tendenciosos para com os investidores ou inclinados a decidir baseados no seu interesse pessoal. Contudo, os sistemas judiciais domésticos e internacional rodeiam-se de dispositivos prudenciais para eliminar preconceitos e conflitos de interesses, particularmente através da garantia aos juízes de um vencimento full-time e um salário fixo adequado. Estas disposições são importantes num sistema devotado unicamente à protecção do investimento contra os estados. A proposta da CE negligencia estas preocupações. Os juízes não têm um emprego full-time e são pagos caso a caso, embora com uma pequena subvenção permanente. Surgem conflitos de interesses, dado não serem impedidos de trabalhar como árbitros no actual ISDS nem como advogados das corporações…ao mesmo tempo.

A proposta da CE apenas deflecte estas dúvidas sobre a independência e imparcialidade dos juízes, através da apresentação destes princípios num anexo à proposta. Ao mesmo tempo, encoraja os investidores a contornar processos legais estabelecidos nos tribunais domésticos…

Isto é um contraste nítido com o conceito da prudência na lei internacional que exige aos indivíduos que esgotem primeiro as possibilidades de recurso aos tribunais locais, para poderem recorrer às instâncias internacionais.

– Fortes tensões relativamente aos princípios constitucionais e á lei europeia. Os capítulos do investimento no CETA e TTIP encontram-se em forte tensão com o estado de direito e os princípios democráticos inseridos nas constituições nacionais e na lei europeia. Adicionalmente, podem afectar a autonomia da ordem legal europeia e a aplicação uniforme dessa lei. Em particular, podem contrariar quaisquer disposições nacionais ou europeias através da imposição de fardos financeiros… incluíndo multas, taxas, penalidades e responsabilidade ambiental.

– A protecção do investimento pelo ISDS/ICS é desnecessária.

Tanto os EUA, como o Canadá, como a UE possuem sistemas judiciais altamente desenvolvidos que garantem apropriada protecção legal aos investidores estrangeiros. Além do mais, não existem quaisquer evidências conclusivas de que a inclusão destas regras de investimento tenham impacto positivo na quantidade de investimento transatlântico. Portanto, a inclusão deste mecanismo no CETA e TTIP é desnecessária.

Exigimos assim veementemente o não enfraquecimento da lei e dos princípios democráticos sobre que se fundam os nossos estados e a UE, providenciando aos investidores estrangeiros um sistema judicial paralelo, desnecessário e estruturalmente pouco sólido.»

Lista dos signatários:
Prof. Anneli Albi, University of Kent
Prof.Diamond Ashiagbor, University of London
Prof. Dr. Antoine Bailleux, Université Saint- Louis –Bruxelles
Dr. Marija Bartl, Universiteit van Amsterdam
Prof. Antonio Pedro Baylos, Universidad de Castilla-La Mancha
Prof. JUDr. Josef Bejček, Masarykova univerzita
Prof. Dr. Ronald Beltzer, Universiteit van Amsterdam
Prof. Dr. Carl Fredrik Bergström, Uppsala Universitet
Prof. Dr. Jochen von Bernstorff, Universität Tübingen
Prof. Dr. Leonard Besselink, Universiteit van Amsterdam
Prof. Georgi Bliznashki, Sofia University
Prof. Nada Bodiroga-Vukobrat, Sveučilište u Rijeci
Prof. Dr. Ted de Boer, Universiteit van Amsterdam
Prof. Alan Bogg, University of Oxford
Dr. Jacco Bomhoff, London School of Economics and Political Science
Prof. Pierre Brunet,Sorbonne LawSchool, University Paris 1 Pantheon-Sorbonne
Prof. Dr. Hauke Brunkhorst, Europa-Universität Flensburg
Prof. Geneviève Burdeau, Sorbonne Law School, University Paris 1 Pantheon-Sorbonne
Prof. Başak Çalı, Hertie School of Governance
Prof. David Capitant,Sorbonne Law School,University Paris 1 Pantheon-Sorbonne
Prof. Valeriu Ciuca, Universitatea „Alexandru Ioan Cuza” din Iași
Prof. Vesna Crnić-Grotić, Sveučilište u Rijeci
Prof. Simon F. Deakin, University of Cambridge
Prof. Joaquim Joan Forner Delaygua,Universidad de Barcelona
Prof. Laurence Dubin, Université de Vincennes à Saint-Denis
Prof. Dr. Hugues Dumont, Université Saint-Louis–Bruxelles
Prof. Julio Faundez, University of Warwick
Prof. Dr. em. Axel Flessner, Humboldt-Universität zu Berlin
Prof. Dr. Andreas Fisahn, Universität Bielefeld 4
Prof. Dr. Andreas Fischer-Lescano, Universität Bremen
Prof. Ognyan Gerdzhikov, Sofia University
Prof. Lazar Gruev, Sofia University
Prof. Adoración Guamán, University of Valencia
Prof.em.Carol Harlow,London School of Economics
Prof. John Harrington, Cardiff University
Prof. James Harrison, University of Warwick
Prof. Alan Hervé, l’Université Bretagne Loire
Prof. Dr. Martijn W. Hesselink, Universiteit van Amsterdam
Prof. David Hiez, Université de Luxemburg
Prof. Dr. Dr. h.c. Christian Joerges, Hertie School of Governance Berlin
Prof. Gábor Kardos, Eötvös Loránd Tudományegyetem
Prof. Dr. Bernhard Kempen, Universität zu Köln
Prof. Plamen Kirov, Sofia University
Prof. Csilla Kollonay-Lehoczky, CenteralEuropean University
Prof. Dr. Martti Koskenniemi, Helsingin yliopisto
Prof. Dr. Markus Krajewski, Friedrich-Alexander-Universität Erlangen-Nürnberg
Prof. Nico Krisch, Graduate Institute of International and Development Studies, Geneva
Prof. Evelyne Lagrange, Sorbonne Law School, University Paris 1 Pantheon-Sorbonne
Prof. Dr. Ján Lazar, Universitas Tyrnaviensis, Trnava
Prof. Dr. Marco Loos, Universiteit van Amsterdam
Prof. Laura Lorello, Università degli Studi di Palermo
Prof. Dr. Verena Madner, Vienna University of Economics and Business
Prof. Ugo Mattei, Università di Torino
Prof. Maria Rosaria Marella,Università degli Studi di Perugia
Prof. Giovanni Marini, Università degli Studi di Perugia
Prof. Arjen Meij, Honorary Professor University of Luxembourg
Prof. Joana Mendes, University of Luxembourg
Prof. Agustín José Menéndez, Universidad de León
Prof. Carlos Manuel Almeida Blanco Morais, Universidade de Lisboa
Prof. Raymond Murphy,National University of Ireland Galway
Prof. Monica Navarro-Michel, Universidad de Barcelona
Prof. Danny Nicol, University of Westminster
Prof. Dr. François Ost, Université Saint-Louis–Bruxelles
Prof. Dr.Viorel Pasca, Universitatea de Vest din Timisoara
Prof.JUDr. Václav Pavlíček, The Charles University in Prague
Prof. Sasho Penov, Sofia University
Prof. Jeremy Perelman,Sciences Po–Paris
Prof. Amanda Perry-Kessaris, University of Kent
Prof. em. Sol Picciotto, Lancaster University
Prof. Iain Ramsay, University of Kent
Prof. Dr. Silke Ruth Laskowski, Universität Kassel
Prof. Anne Saab,Graduate Institute of International and Development Studies, Geneva
Prof. Joel Samuelsson, Uppsala Universitet
Prof. Cesare Salvi,Università degli Studi di Perugia
Prof. Dr. Giovanni Sartor,Università di Bologna
Assoc. Prof. Andrej Savin, Copenhagen Business School
Prof. Dr. Harm Schepel, University of Kent
Prof. Robert Schütze, Durham University
Prof. Dr. Danielius Serapinas, Mykolas Romeris University
Prof. Stijn Smismans, Cardiff University
Prof. Constantin Stamatis, Aristotle University of Thessaloniki
Prof. Petros Stangos, Aristotle University of Thessaloniki
Prof. Georgi Stefanov, Sofia University
Prof. Arkadiusz Sobczyk,Uniwersytet Jagielloński
Prof. Jean-Marc Sorel, Sorbonne Law School, University Paris 1 Pantheon Sorbonne
Prof. Krasimira Sredkova, Sofia University
Assoc. Prof. Celine Tan, University of Warwick
Assoc. Prof. Jan Trzaskowski, Copenhagen Business School
Prof. William Twining, University College London
Prof. Dr. Christoph Urtz, Universität Salzburg
Prof. Dr. Wouter Vandenhole, Universiteit Antwerpen
Prof. Dr. Javier A. González Vega, Universidad de Oviedo
Prof. Dr. Ingo Venzke, Universiteit van Amsterdam
Prof. Simone Vezzani, Università degli Studi di Perugia
Prof. Horatia Muir Watt, Sciences Po–Paris
Prof. Lotta Vahlne Westerhäll, Göteborgs universitet
Prof. Ralph Wilde, University College London
Dr. Marco Aparicio Wilhelmi, Universitat de Girona
Prof. Toni Williams, University of Kent
Prof. Siobhán Wills, Ulster University
Prof. Mikhail Xifaras, Sciences Po–Paris

(fonte)