Tradução do artigo, The hijacking of the Munich Security Conference de Thierry Meyssan
A história ensina-nos isso – cada vez que um sistema desmorona seus líderes não percebem a verdade até que sejam arrastados pela tempestade. Assim, os representantes políticos da União Europeia reunidos como todos os anos em Munique para a sua Conferência de Segurança ficaram chocados ao ouvir Sergey Lavrov (diplomata russo e Ministro das Relações Exteriores da Rússia desde 2004 – Ndt) falar de uma ordem mundial pós-ocidente. E, no entanto, o mundo desmorona-se sob os seus pés – os povos árabes resistem desesperadamente a guerras e falsas revoluções, enquanto o povo dos Estados Unidos elegeu um anti-imperialista para a Casa Branca. Os organizadores da Conferência não têm cura – eles estavam a defender os interesses do Estado dos EUA contra o governo Trump.
Rede Voltaire | Damasco (Síria) | 21 de Fevereiro de 2017
O jantar de Gala da Conferência (18 de Fevereiro de 2017, 23h)
Então porque é que os Europeus entenderam que o povo norte-americano tem interesses vitais nas margens do Dnipro e que a «solução política na Síria» significa a substituição da República pelos Irmãos Muçulmanos? Simplesmente porque foi o que a administração Obama lhes tinha apontado. A mesma que foi repudiada pelo povo norte-americano.
Certamente que todo mundo pode ver a luta entre a administração Trump de um lado e o grupo da “Continuidade do Governo dos Estados Unidos” por outro. O chão tremeu quando Donald Trump excluiu a CIA e o Chefe do Estado-Maior Conjunto do Conselho de Segurança Nacional [4].
Todos puderam observar o modo como e em represália, a CIA recusou a acreditação de Segurança a seis conselheiros do Presidente, acusou o Conselheiro de Segurança Nacional de ser um espião russo, forçando-o à demissão, e como perseguiu outros quatro da equipe presidencial.
Mas perder algumas batalhas não significa perder a guerra e é triste que os Europeus – escravizados por tanto tempo – não tenham consciência disso. Como se pode acreditar que Donald Trump iria varrer em alguns dias o “Estado profundo” tão poderoso? E como se pode imaginar que as suas primeiras derrotas o vai fazer renunciar? [5]
Ao longo dos últimos anos, a Conferência de Segurança foi um caminho para a Alemanha servir como ponte entre os Estados Unidos e os seus parceiros europeus. Este ano, ela teve o único objectivo de forçar os líderes da UE a confirmarem a sua vassalagem ao Estado Profundo dos Estados Unidos sem ter em conta a vontade expressa do povo norte-americano e a mudança na Casa Branca.
Um documento preparatório elaborado por organizadores alemães da conferência foi dado aos participantes. A imprensa teve o cuidado de não o mencionar. Podemos ler nele um artigo de Volker Perthes, autor do plano Feltman para a capitulação total e incondicional da República Árabe da Síria [6]. Este eminente “especialista” expressa nele a sua visão do “Grande Médio Oriente“, ou melhor, a sua visão para a “continuidade do governo dos Estados Unidos“. [7]
1. [Mesmo se não chegarmos a remodelar], esta região não vai sair ilesa das guerras e da “Primavera Árabe”. [Nós não teríamos feito tudo isto para nada].
2. O conflito entre a Arábia Saudita e o Irão transformou-se num conflito sectário sunita/xiita [que mascara as nossas ambições geopolíticas].
3. Enquanto todo mundo é apanhado neste falso conflito religioso ninguém presta atenção à situação dos palestinianos [em benefício da maior tranquilidade do Estado colonial israelita].
4. Enquanto os europeus estão unanimemente cansados destes rios de sangue longe de casa e anseiam pelo triunfo da Irmandade Muçulmana, ninguém em todo o Médio Oriente Alargado admite a derrota.
5. Durante a guerra na Síria, fizeram-se e desfizeram-se muitas alianças nível regional, a mais recente uniu a Rússia, Turquia e Irão, que não deverá [felizmente] durar mais que as outras.
6. A Síria e Iraque não vão derrotar o terrorismo e só encontrarão paz com governos inclusivos [isto é, quando aceitarem introduzir a Al-Qaeda e o Daesh nos seus governos].
7. Tudo isso só poderá acabar para todos os povos do Médio Oriente alargado, com uma grande conferência internacional na qual os ocidentais irão determinar o seu futuro, como o Congresso de Viena (1814) a Aliança Quádrupla decidiu o destino do resto do mundo.
Certamente, nem face ao voto do povo dos Estados Unidos, nem face à resistência dos povos árabes, os líderes europeus não mudam. Somente os Povos Europeus os podem fazer mudar.
1] Münchner Sicherheitskonferenz, site oficial
[2] « La gouvernance unipolaire est illégitime et immorale », par Vladimir Poutine, Réseau Voltaire, 11 février 2007.
[3] « Contre Donald Trump : la propagande de guerre », Thierry Meyssan, Réseau Voltaire, 7 février 2017.
[4] “Presidential Memorandum : Organization of the National Security Council and the Homeland Security Council”, Donald Trump, Voltaire Network, 28 January 2017.
[5] « L’Otan suspend ses opérations en Syrie », Réseau Voltaire, 16 février 2017.
[6] « L’Allemagne et l’Onu contre la Syrie », par Thierry Meyssan, Al-Watan (Syrie) , Réseau Voltaire, 28 janvier 2016.
[7] « No order, no hegemon. The Middle East in flux », Volker Perthes, Security Challenges (Germany), Voltaire Network, February 16,2017.
Nota: links e realces desta cor são da minha responsabilidade